Por Luan Apollo Ribeiro Santos Messias

Pesquisa a ser apresentada ao IV Seminário Brasileiro de Museus, Memória e Museologia LGBT, promovido por integrantes da Rede LGBT+ de Memória e Museologia Social, pela Revista Memória LGBT+ e pelo Departamento de Museologia da Universidade Lusófona.
Sou Luan Apollo, discente do curso de Graduação de Museologia da Universidade Federal de Sergipe/Campus de Laranjeiras. Sou um homem trans preto, pansexual, poeta, artesão, nordestino, natural do município Itabuna, Estado da Bahia (áudio descrição no dia do evento).
Minha pesquisa propõe examinar, inicialmente no Estado de Sergipe, o apagamento de identidades trans e LGBTs nos espaços de memória oficial do Estado. Nessa construção, ressalto a importância do resgate de memórias identitárias dos corpos trans e LGBTs nos espaços de representação social e também busco refletir quais ações estratégicas podem ser utilizadas na reparação historiográfica do campo. Embora saiba que isso contraria as estatísticas destinada ao meu corpo, hoje ocupo esse espaço museológico com orgulho e objetivo trazer a voz de um transmasculino, preto e futuro Museólogo. Assim, acredito que minha pesquisa valorizará a comunidade trans que, em meu país, lidera o ranking de ataques violentos, visto que o Brasil é o país mais violento do mundo para a população trans.
Onde encontramos memórias LGBTs no estado de Sergipe? Existem pontos de memória LGBTs públicos ou privados no Estado, reconhecidos pelo IBRAM ou governo? Seriam os movimentos sociais esses pontos de memória LGBTs do Estado? Onde estão as memórias Trans na memória oficial do Estado de Sergipe?
Nesta pesquisa, o objetivo principal é o reconhecimento e empoderamento de corpos trans e LGBTs e, para isso, pretendo identificar e valorizar esses corpos nos espaços de memória dando voz e promovendo representatividade. A metodologia usada é, principalmente, pesquisas bibliográfica no campo das artes, na literatura e na história de Sergipe como um todo. Também utilizarei as produções acadêmicas que versam sobre minha grande temática. Paralelamente a isso, farei uma análise de editais que reconhecem os pontos de memória no Estado de Sergipe.
Também farei pesquisa oral com o intuito de ouvir e registrar as escrevivências1 trans, reconhecendo que os corpos dissidentes de gênero são produtores intelectuais e autores de nossas Histórias. Dessa forma, questionarei o condicionamento social colonizador heterocisnormativa, bem como as diversas barreiras da Museologia Tradicional atrelada à memória oficial.
Como escopo teórico da Museologia trarei referências que possibilitam a inclusão da comunidade trans e LGBTs em nossa história e memória utilizando autoras e autores da Museologia Social e/ou Sociomuseologia por saber que estes estão mais alinhados à temática da inclusão. Do Brasil posso citar as professoras Waldisa Rússio, Maria Célia Teixeira Moura Santos, Cristina Bruno e os professores Tony Boita e Jean Batista como precursores da Museologia LGBT na América Latina e de Portugal o professor Mario Moutinho. Fora da área da museologia outros autores e autoras certamente serão utilizados e, nesse cenário, hoje posso citar Ian Habib, que é multi artista e idealizador e criador do MUTHA (Museu Transgênero de História e Arte) que é o primeiro museu Transgênero do país.
Onde estão inseridas as memórias LGBTs e as pessoas Trans na memória oficial no Estado de Sergipe?
A partir da necessidade de criar estratégias para garantia de políticas públicas e políticas patrimoniais que contemplassem a todos os corpos, há mais de 10 anos foi proposta pelo Professor Dr. Tony Boita, professor Dr. Jean Baptista e pela professora Dra. Camila Moraes Wichers, a categoria de pesquisa Museologia LGBT. Tal categoria conceitual busca contemplar todas as populações vulneráveis que tiveram de alguma forma as suas histórias apagadas da memória oficial colonizadora.
Adotando uma perspectiva do século XXI, primeiramente precisamos entender que o conceito de gênero e sexualidade, se subdivide em categorias: sexo, gênero, identidade de gênero e orientação sexual. A discussão do tema continua sendo um tabu em diversos espaços, mas é necessário compreender essas particularidades para reconhecer, respeitar e validar as características dos corpos, que são múltiplos e diversos em suas vivências e performances.
O sexo condiz ao nascimento, uma formação biológica dos cromossomos, tradicionalmente conhecidos como macho e fêmea e os intersexos, que quebram os paradigmas da condição única ao sexo biológico, são pessoas que já nascem com características internas ou externas de ambos os sexos predominantes. O gênero, por outro lado, se dá a partir de uma construção social e cultural do masculino e feminino onde a performance de gênero é um processo de socialização que se modifica de acordo os períodos da História e variando conforme as regiões. Assim, o indivíduo é condicionado a performar padrões sociais impostos pelo sexo biológico.
A identidade de gênero, sob outro aspecto, é como o ser humano se identifica apesar do sexo biológico e dos “padrões”, pois o órgão genital não vai imperar em como o indivíduo se identifica e se expressa. Travestis, mulheres e homens trans ou cis, transmasculinos e os não bináries, são algumas das identidades dissidentes de gênero atuais. Quem se identifica com o sexo biológico que foi designado no nascimento é chamando de cisgênero. Hoje o gênero não é predominantemente imposto ao sexo no nascimento e nossos corpos dissidentes surgem para descolonizar essas imposições da binaridade hegemônica heterocisnormativa.
A orientação sexual diz como a pessoa vai se relacionar afetivamente. Há lésbicas e gays ou homossexuais, os bissexuais, os pansexuais que se relacionam com indivíduos independente da genital rompendo barreiras falocêntricas, tem os assexuados que não sentem atração sexual e várias outras categorias que buscam reconhecer e acolhedor diversas identidades. Todas essas particularidades serão observadas no campo.
Fazendo uma análise, a partir de visitas aos museus que transmitem a memória oficial do Estado de Sergipe, fica evidente a exclusão de corpos trans e LGBTs, bem como a invalidação das identidades que divergem do padrão colonizador eurocêntrico, o que ocasiona a anulação de diversas outras performances identitárias. Assim, encontro na minha pesquisa as lacunas nos espaços musealizados e busco criar estratégias para ressignificar a memória oficial do Estado de Sergipe, incluindo as potências LGBTs, principalmente de corpos trans. Acredito que criar e oportunizar o reconhecimento identitário da comunidade transgênero, a partir das suas vivências, possibilitará a existência de outros patrimônios.
Objetivo, a partir de vivências, é pesquisar trajetórias reais, identificar e documentar os registros da comunidade Trans para contribuir na construção de outras memórias oficiais. Como a arte desde sempre permeou a comunidade LGBT, inicialmente com as travestis e drags, acredito que o resgate desses protagonismos e de memórias trans masculinas se torna essencial para reparar historicamente a comunidade.
REFERÊNCIAS
BOITA, Tony Willian. Museologia LGBT: cartografia das memórias LGBTQI+ em acervos, arquivos, patrimônios, monumentos e museus transgressores. Rio de Janeiro: Metanoia, 2020.
BOITA, Tony Willian; BAPTISTA, Jean. Museologia Comunitária, Comunidades LGBT e Direitos Humanos: estratégias de superação de fobias à diversidade sexual no Brasil. VENTILANDO ACERVOS , v. 1, p. 132-146, 2017. Disponível em: https://www.sumarios.org/artigo/museologia-comunit%C3%A1ria-comunidades-lgbt-e-direitos-humanos-estrat%C3%A9gias-de-supera%C3%A7%C3%A3o-de-fobias
BOITA, Tony Willian; BAPTISTA, Jean. Memória e esquecimento LGBT nos museus, patrimônios e espaços de memória no Brasil. Revista do Centro de Pesquisa e Formação SESC, v. 5, p. 108-119, 2017. Disponível em: https://centrodepesquisaeformacao.sescsp.org.br/revista/edicao5.php?cor=verde
BRUNO, Maria Cristina Oliveira . Museologia: entre abandono e destino. Revista Museologia & Interdisciplinaridade , v. 9, p. 19-28, 2020. Disponível em: https://periodicos.unb.br/index.php/museologia/article/download/31590/26128/72378
GUARNIERI, Waldisa Rússio Camargo. Museologia e Museu. Disponível em: https://pt.scribd.com/document/357839494/GUARNIERI-Waldisa-Russio-C-Museologia-e-Museu
HERMINIO, Beatriz. A escrevivência carrega a escrita da coletividade, afirma Conceição Evaristo. 2022.Disponível em: http://www.iea.usp.br/noticias/a-escrevivencia-carrega-a-escrita-da-coletividade-afirma-conceicao-evaristo
MOUTINHO, Mario Canova. Sobre o conceito de museologia social. Cadernos De Sociomuseologia. Disponível em: https://revistas.ulusofona.pt/index.php/cadernosociomuseologia/article/view/467
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